Um trabalhador mantido em condições análogas à escravidão por quase uma década no município de Planura, no Triângulo Mineiro, poderá ser indenizado em até R$ 1,3 milhão. O valor foi solicitado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em uma ação civil pública ajuizada na Justiça do Trabalho, divulgada na última segunda-feira (28).

Segundo o MPT, os três acusados — homens de 57, 40 e 24 anos — devem arcar com R$ 300 mil em verbas salariais e rescisórias, além de providenciar a anotação do contrato de trabalho na carteira da vítima, cobrindo o período de 2016 a 2025. A ação ainda pede indenização por danos morais no valor de R$ 1 milhão à vítima e R$ 2 milhões por danos morais coletivos.

“A indenização por dano moral individual é uma reparação revertida diretamente à vítima, enquanto a coletiva é destinada à sociedade, geralmente utilizada para obras ou melhorias no local onde ocorreu o crime”, explicou o auditor fiscal do trabalho Humberto Monteiro Camasmie.

Vítima foi forçada a tatuar iniciais dos patrões

A vítima, um homem homossexual de 32 anos, foi obrigada a tatuar as iniciais de dois dos empregadores nas costelas, como forma de “marcação de posse”. Ele relatou ter sofrido agressões físicas, psicológicas e abusos sexuais ao longo do período em que trabalhou para o trio.

Os suspeitos, presos em flagrante pela Polícia Federal, miravam pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade social e emocional. Segundo as investigações, eles criavam laços de confiança para, posteriormente, impor um regime de trabalho escravo.

Nove anos de abusos

O homem trabalhou como empregado doméstico por nove anos. Outra vítima, uma mulher transexual uruguaia de 29 anos, permaneceu seis meses em condições semelhantes. Ela relatou ter recebido entre R$ 100 e R$ 600 por mês e sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC), possivelmente causado pelo estresse e pela violência vivida. Após o AVC, foi abandonada pelos patrões e conseguiu retornar ao Sul com ajuda de amigos.

Os acusados, um contador, um administrador e um professor que viviam em união poliafetiva (trisal), atraíam as vítimas pelas redes sociais, oferecendo moradia, alimentação e promessas de educação e cursos profissionalizantes em uma instituição que eles mantinham na cidade.

Eles estão presos na Penitenciária Professor Aluízio Ignácio de Oliveira, em Uberaba, acusados de tráfico de pessoas para fins de trabalho análogo à escravidão.

Investigação e acolhimento das vítimas

O caso foi descoberto após denúncia anônima feita ao Disque 100, que apontava indícios de cárcere privado, exploração sexual e trabalho forçado. Durante a inspeção, auditores fiscais confirmaram as condições degradantes e o histórico de violências sofridas.

A vítima de 32 anos contou que foi ameaçada com vídeos de abusos sexuais gravados pelos empregadores para evitar fugas ou denúncias. Já a mulher transexual não sofreu abusos sexuais, mas presenciou diversas agressões.

As vítimas estão recebendo atendimento médico, psicológico e jurídico por meio da Clínica de Enfrentamento ao Trabalho Escravo da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e da Unipac.