Afundado em uma profunda crise financeira e societária, o grupo cimenteiro Nassau está sob nova administração. Representantes de cerca de 65% do espólio do empresário João Santos, que criou a cimenteira morto em 2009, conseguiram destituir José e Fernando Santos, filhos do fundador, do comando dos negócios, nomeando dois executivos de mercado para a função deles.
Titulares do restante da herança, os irmãos Santos – cuja administração é investigada pela Polícia Federal – não reconhecem a legitimidade das mudanças e levaram a questão à Justiça.
Dono de 10 fábricas de cimento, das quais apenas três em atividades – Cachoeiro do Itapemirim (ES), Mossoró (RN) e Capanema (PA) – o grupo Nassau é parte dos bens deixados por João Santos, avaliados em torno de R$ 5,6 bilhões. Os herdeiros são cinco filhos do empresário e alguns netos.
Dois filhos do fundador à frente do grupo teriam transformado passivo tributário de R$ 8,6 bi em patrimônio pessoal
O grupo pernambucano tem ainda duas fábricas de papel e celulose em Coelho Neto (MA) e Jaboatão dos Guararapes (PE), duas usinas de açúcar e álcool, além das emissoras de rádio e TV Tribuna em funcionamento no Espírito Santo e Pernambuco.
Nos bons tempos, a Nassau chegou a ser o segundo maior fabricante de cimento do país, atrás apenas da Votorantim Cimentos.
Em dezembro, o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE) destituiu Fernando Santos da função de inventariante, e nomeou o advogado Augusto Quidute para o cargo. A decisão ocorreu sete meses após grupo Nassau ter sido alvo da operação Background, da Polícia Federal, que faz parte de uma investigação sobre um suposto esquema criminoso no grupo Nassau. Respondendo a um pedido da parcela de herdeiros que estava fora da gestão da empresa, Quidute convocou uma assembleia este mês, para análise das finanças do grupo.
Os irmãos Santos não compareceram à reunião. Os demais presentes, suas irmãs e netos, recomendaram ao inventariante a reprovação das contas. Como consequência, houve a destituição dos administradores e eleição de novos. Um deles é Paulo Narcélio Simões do Amaral, executivo experiente em gestão de ativos estressados, que foi presidente da OGX de Eike Batista já na fase de reestruturação da empresa, em 2013, e conselheiro, em 2017.
O outro gestor eleito foi Guilherme Rocha, que era administrador do arquipélago de Fernando de Noronha, cargo ligado ao governo do Estado de Pernambuco, até o início do mês.
Segundo o Valor apurou, a nova administração assumiu os negócios na segunda-feira com objetivo inicial de fazer uma auditoria nas finanças do grupo. Atualmente, não se sabe o quanto o grupo cimenteiro Nassau fatura – há uma informação extraoficial de que o montante era de cerca de R$ 3 bilhões 11 anos atrás. O grupo nunca publicou demonstrações financeiras. De acordo com ex-funcionários, a administração vinha sendo conduzida de forma rudimentar.
Fernando, 75 anos, e José, 85, entraram com uma ação para invalidar a assembleia e seus efeitos. Em nota enviada ao Valor, eles dizem que são os “reais administradores” do grupo Nassau e que “não se reconhece a legalidade, legitimidade e validade do ato de eleição” dos novos administradores. Eles disseram ainda que lamentam que a Junta Comercial de Pernambuco (Jucepe) “tenha violado suas próprias normas para arquivar uma ata sem valia, o que não condiz com o histórico desse conceituado órgão”.
Antes da assembleia que aprovou as mudanças, os irmãos Santos publicaram comunicado no Jornal Folha de Pernambuco, no dia 16, tentando impugnar a reunião sob argumento de que o inventariante, Augusto Quidute, não teria legitimidade para a convocação.
Quidute afirmou ao Valor que as cotas da holding (90%) ainda estão em nome do espólio de João Santos na junta comercial. “Do ponto vista jurídico, quando isso acontece, a única pessoa que pode representar o espólio e as cotas é o inventariante dativo”, disse. “Esse mesmo argumento sempre foi defendido por Fernando Santos, até ele ser destituído da função”, afirmou.
Um dos motivos para a herança de João Santos ainda não ter sido fatiada é que herdeiros que estavam fora da administração do grupo não têm dinheiro para pagar o imposto sobre transmissão de bens (ITCMD) devido ao Estado, que foi calculado em R$ 220 milhões – ou 4% em cima do patrimônio. O imposto deve ser quitado antes distribuição dos bens.
Quatro aos atrás, netos e filhas de João Santos entregaram às autoridades uma denúncia com supostos crimes que estariam sendo cometidos por José e Fernando na condução dos negócios da família. Em um dossiê de 91 páginas, eles apontaram indícios de práticas como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, fraudes a execuções trabalhistas e formação de quadrilha.
Em maio do ano passado, a Polícia Federal deflagrou a Background, com colaboração da Procuradora Geral da Fazenda Nacional. A administração do grupo teria transformado um passivo tributário de R$ 8,6 bilhões em patrimônio pessoal de sócios, segundo as informações.
José e Fernando são suspeitos de dar calote em 8 mil ex-funcionários e no governo federal, com descumprimento de acordos em sucessivos programas de refinanciamento de débitos federais, enquanto esvaziavam os cofres do grupo na última década. Procurada, a Polícia Federal não comentou o avanço das investigações.
Com informações do Valor Econômico
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