A publicidade de jogos de azar e casas de apostas vêm se tornando cada vez mais comum nos perfis de produtores de conteúdo, levantando discussões acaloradas sobre o tema e sobre a responsabilidade desses influenciadores para com o seu público –especialmente quando se trata daqueles que conversam com jovens.
“Eu conheci o jogo de apostas por meio de uma influenciadora da minha cidade e instalei no meu celular. Foi o meu primeiro contato com esse tipo de plataforma”, conta Aylla Ruth, de São Luís, no Maranhão. Na primeira jogada, a jovem apostou apenas R$ 20 e perdeu o dinheiro. “Eu percebi que o jogo só permitia que sacasse R$ 50, então recarreguei o resto para completar o valor e retirá-lo. Porém, o app não explica que você só pode sacar o dinheiro que ganhar dentro dele. Como não tinha mais o que fazer, continuei jogando e só ando perdendo”, revelou.
Em geral, os aplicativos exigem que o usuário deposite algum valor para iniciar as apostas. Com diversos formatos e estilos, as pessoas costumam ganhar nas primeiras rodadas, mas depois fica cada vez mais difícil.
“Você até ganha um certo valor, mas depois de já ter gastado o triplo dele. Então, dá aquela sensação de que está ganhando, mas na verdade é o contrário disso”, complementa a estudante.
A legislação considera, desde 1941, contravenção penal “estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público”. Sendo assim, nenhuma forma de aposta envolvendo sorte, seja online ou presencial, é permitida. No entanto, apesar de serem ilegais, esses jogos estão disponíveis para ser acessados por qualquer pessoa em território nacional, porque os domínios dos sites são alocados em países que permitem e regulamentam a exploração dos jogos de azar.
“Acabaram as barreiras territoriais, no sentido de poder acessar conteúdo, fazer compras e contratar serviços”, explica a advogada especializada em direito digital, Elaine Keller, que reforça que as apostas esportivas são legais no Brasil.
“O governo Temer sancionou a lei 13.756/18, que regulamenta as apostas de cota fixa –como juridicamente são conhecidas as apostas esportivas. Porém, não existe uma regulamentação à lei. Com isso, todos os sites que operam no mercado nacional são hospedados em outros países, principalmente em paraísos fiscais”, complementa. “Se essa plataforma estiver em território nacional e não for regulamentada como uma aposta esportiva, é uma contravenção penal.”
Melissa Yulli, 25 anos, aposta em plataformas esportivas há dois anos. A jovem conta que se interessa por esportes desde os 14 e que foi por meio das redes sociais que conheceu o universo das apostas. “Eu pensei: por que não tentar fazer uma renda extra com algo de que eu gosto e sobre o qual tenho muito conhecimento?’”, disse. A vendedora reforça que, apesar de já ter conquistado valores significativos em apostas, é importante tomar cuidado com as propagandas enganosas.
“Não concordo que todas as casas de apostas sejam boas para uma renda extra. Muitas têm mensagens enganosas, principalmente aqueles que prometem que você vai ganhar dinheiro rápido e fácil. Muitas vezes precisa contar com a sorte, e a possibilidade de perder é muito maior”, diz Mel. Ela ainda acrescenta: “Infelizmente, a maioria das pessoas só vêem isso como uma forma de ganhar dinheiro rápido. Esse pensamento acaba sendo frustrante, porque é uma oportunidade para fazer dinheiro, mas é necessário paciência e estudo.”
Responsabilização dos influenciadores
A discussão sobre a divulgação de jogos de apostas por parte dos influenciadores digitais divide opiniões nas redes sociais. Recentemente, a influenciadora Camilla de Lucas movimentou a web ao se posicionar e alertar os seguidores sobre o consumo de jogos de sorte nas redes sociais.
No Instagram, a ex-BBB destacou ser “inadmissível” que influencers indiquem jogos do tipo com a justificativa de que o público vai ganhar dinheiro, e disse que os produtores de conteúdo não costumam jogar o que divulgam, apenas gravam a publicidade e estimulam os seguidores a baixarem o aplicativo.
Nos jogos de azar, a probabilidade de você perder é maior do que a de você ganhar e obter lucro. Ainda assim, na maioria das publicidades veiculadas por personalidades do universo digital, dificilmente se fala sobre a perda de dinheiro e os impactos negativos que o jogo pode causar à vida de alguém.
“Produtores de conteúdo com muitos seguidores têm de fato poder de influenciar pessoas, e é um perigo quando indicam coisas que podem ser prejudiciais”, diz a psicóloga especialista em emoções Luana Ganzert. “Ostentar a vida perfeita e vendê-la como se tivesse sido conquistada através desse dinheiro fácil contribui para que pessoas menos esclarecidas acreditem.”
“É importante evitar propagandas enganosas ou exageradas, como promessas de dinheiro rápido e fácil. Sempre deixar claro que os aplicativos não devem ser utilizados por menores de idade e que podem levar a comportamentos de jogos excessivos ou problemáticos”, complementa Melissa Yulli.
A advogada Elaine Keller reforça que os influenciadores podem, sim, ser responsabilizados pelos danos causados aos seguidores que apostaram nessas plataformas por indicação deles. “O apostador que eventualmente tiver algum prejuízo pode ingressar com uma ação interna contra o influenciador pela responsabilidade dele em divulgar aquilo que era um serviço ou uma prática ilegal, que gera danos”, explica a profissional.
“Uma vez que o influenciador é monetizado para divulgar algo, ele passa a ter responsabilidade pelo Código de Defesa do Consumidor do Brasil, que determina que os intermediários em prestação de serviço são responsabilizados pela cadeia de consumo.”
Vícios
Apesar das possibilidades de apostar recreativamente, a pandemia levou a um aumento na dependência dos jogos de apostas. O fácil acesso, o tempo ocioso e a falta de regulamentação desencadearam um problema sério de dependência de jogos, fazendo com que as pessoas usassem mais do tempo disponível em aplicativos.
“Um jogo tem por finalidade a diversão e o entretenimento. Porém, os jogos de azar têm trazido prejuízos significativos para a vida das pessoas que se viciam neles”, explica a psicóloga Luana Ganzert. “Abstinência, irritabilidade, falta de controle do tempo por excesso de tempo disponível para o jogo, problemas no rendimento profissional e social são alguns dos principais sinais de que uma pessoa está viciada”, complementa.
A profissional explica que o princípio da dependência é o mesmo para todas as classificações de dependência: as pessoas podem começar a jogar por diversão, porque outras pessoas do seu convívio fazem, por curiosidade, ou mesmo, na intenção de ganhar dinheiro. “A diferença é que a dependência em jogos é comportamental, ou seja, existe compulsão por agir de determinada forma e não por influência de uma substância, como na dependência de álcool ou outras drogas, por exemplo.”
Melissa conta que, apesar de apostar há alguns anos, toma cuidado para não se deixar viciar. “Eu administro bem o tempo que passo apostando, não faço qualquer tipo de aposta e faço gestão para não perder o que consegui”, conta a vendedora.
“Não existe dinheiro fácil e rápido no mundo das apostas. É necessário paciência. Antes de começar a apostar, é importante estabelecer um orçamento para aquilo e tomar cuidado para não exceder esse valor. É importante não jogar um dinheiro que você não pode perder, estabelecer limites de tempo e não procurar demais quando não tiver boas oportunidades no mercado. É importante saber quando parar”, finaliza.
Com informações da revista Marie Claire
[…] vez mais produtores de conteúdo promovem sites de apostas e como apostar, aumentado ainda mais a popularidade da atividade. De acordo com uma […]