O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) formou maioria para tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível por oito anos, em julgamento de ação de abuso de poder político do então presidente ao realizar uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada e atacar o sistema eleitoral, em julho do ano passado. O voto decisivo foi proferido pela ministra Carmen Lúcia, vice-presidente da corte eleitoral, no início da tarde desta sexta-feira (30).
A ministra abriu seu voto, na quarta sessão da corte destinada ao julgamento do ex-presidente, dizendo que acompanhou os argumentos do corregedor-eleitoral Benedito Gonçalves, relator do processo movido pelo PDT, e considerou que o discurso de Bolsonaro enquanto Chefe do Executivo, baseado em críticas às urnas eletrônicas e autopromoção da sua gestão, fez parte de uma estratégia eleitoral, desvirtuando qualquer institucionalidade do encontro.
Além do relator Benedito Gonçalves e a ministra Carmen Lúcia, os ministros Alexandre de Moraes, Floriano Marques e André Ramos votaram pela inelegibilidade, enquanto Raul Araújo e Kassio Nunes Marques abriram divergência.
“O encontro foi organizado por um grupo pequeno ligado ao presidente da república com o propósito de apresentar seu monólogo, em que teve a autopromoção que é comprovada pelas transcrições”, disse Carmen Lúcia em seu voto, cujo resumo dos argumentos foi apresentado em pouco mais de 20 minutos.
“Há referências de desqualificação de Luiz Inácio Lula da Silva, principal adversário. Houve agravos contundentes ao poder Judiciário, aos ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes, de uma forma extremamente grave e contundente”, prosseguiu a ministra.
Seguindo o voto do relator, Carmen Lúcia afirmou que a retórica de Bolsonaro no encontro fez parte de uma estratégia com objetivo de desqualificar o processo eleitoral, e assim fortalecer sua candidatura à reeleição. A ministra também citou as críticas do então mandatário à presença de observadores internacionais nas eleições.
Para Kassio Nunes Marques, que votou pela absolvição do ex-presidente no processo, a reunião com embaixadores deve ser interpretada como uma reação espontânea de Bolsonaro ao encontro realizado por Edson Fachin, então presidente do TSE, com representantes de governos estrangeiros, dias antes.
Nunes Marques também pontuou que o voto impresso – um dos temas defendidos pelo então mandatário – havia dominado o debate público desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, com ampla interlocução entre os Poderes a respeito, até a discussão ter sido encerrada pela rejeição, no Congresso, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 135/19, em julho de 2021.
O magistrado interpretou que, dessa forma, o presidente que tentaria a reeleição meses depois não teve como objetivo obter vantagem contra os outros candidatos a partir da reunião no Alvorada. O fato de ter havido comparecimento recorde dos eleitores nas seções eleitorais, segundo ele, mostra que ainda que houvesse uma estratégia que poderia ser interpretada como irregular nos bastidores do evento, ela teria sido frustrada.
Nunes Marques também afastou a jurisprudência estabelecida em 2021 e citada no voto do relator Benedito Gonçalves, que diz respeito à cassação e inelegibilidade do deputado estadual eleito pelo Paraná em 2018, Fernando Francischini, por divulgar notícias falsas contra o sistema eletrônico de votação.
O magistrado considera que a fala do político paranaense foi feita diretamente ao seu eleitorado, em live realizada no dia do pleito, enquanto mimetizava fatos ao vivo dando um tom de imediatismo às falsas notícias sobre urnas eletrônicas fraudadas.
Em outra tese apresentada pelo relator e refutada por Nunes Marques, de que a reunião fez parte de um fio condutor entre fatos do passado e episódios que ocorreram posteriormente ao encontro na residência oficial da presidência da república, o ministro pontuou em seu voto que o reconhecimento pelo então ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, de que seria iniciado um período de transição, após a derrota de Bolsonaro, trata-se de uma prova de que a reunião com os embaixadores foi algo pontual, sem qualquer ligação com outros acontecimentos ou aspiração de subverter o cenário estabelecido pela vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas urnas.
Defesa deve recorrer
Nos últimos dias, os advogados do ex-presidente sinalizaram que devem entrar com recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal (STF), alegando a utilização de prova indevida, como no caso da minuta do golpe encontrada na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, durante operação da Polícia Federal, em janeiro, ainda que o documento não tenha sido citado nos votos favoráveis à condenação do ex-presidente.
Caso seja constatada alguma incongruência na sentença que será publicada, a defesa também pode entrar com embargos de declaração na Corte Eleitoral, em pedido que será analisado pelos magistrados posteriormente.
De acordo com a Lei da Ficha Limpa, o resultado do julgamento tem efeitos imediatos, o que significa que Jair Bolsonaro seguirá inelegível enquanto aguarda a análise de seus recursos, seja no TSE ou no STF. A condenação, no entanto, não cassa os direitos políticos do ex-presidente, o que garante sua atuação como cabo eleitoral de políticos aliados nas eleições municipais previstas para o próximo ano.
Com informações do InfoMoney
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